Entidade afirma que o prefeito de Goiânia extrapola competências ao propor retorno de monitorados desempregados à prisão
A Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO) classificou como “inconstitucional” e “ilegal” a proposta do prefeito de Goiânia, Sandro Mabel (União Brasil), de determinar o retorno à prisão de pessoas monitoradas por tornozeleira eletrônica que estejam desempregadas. A medida, anunciada em vídeo publicado nas redes sociais do gestor no último domingo (19/10), gerou forte repercussão e críticas de entidades jurídicas e de direitos humanos.
Em nota enviada ao portal Mais Goiás, o Fórum das Comissões Criminais da OAB-GO destacou que qualquer tentativa de interferência do Executivo Municipal em questões relativas à execução penal fere a Constituição Federal e a Lei de Execução Penal (LEP), que atribuem exclusivamente ao Poder Judiciário as decisões sobre progressão ou regressão de regime, concessão de benefícios e monitoramento de condenados.
“Interferência viola a separação dos Poderes”, afirma OAB-GO
De acordo com o comunicado, “a própria LEP estabelece regras claras sobre a monitoração eletrônica, sua fiscalização e hipóteses de revogação, prevendo consequências graduadas em caso de descumprimento, mediante decisão fundamentada do juiz competente”. A entidade frisou que a monitoração eletrônica é medida judicial, e não administrativa, e que qualquer sanção ao descumprimento deve seguir rito processual.
A OAB-GO também alertou que declarações como as do prefeito podem comprometer a segurança jurídica e o princípio da separação dos Poderes, ao transferir atribuições típicas do Judiciário para o Executivo. “O diálogo institucional, dentro dos limites legais, é o único caminho legítimo para equilibrar proteção social, garantias individuais e efetividade da execução penal”, diz outro trecho da nota.
Mabel recua, mas reforça “ordem na cidade”
Após a polêmica, Sandro Mabel suavizou o discurso nesta quarta-feira (22/10), afirmando que a Prefeitura de Goiânia pretende apenas “ajudar na fiscalização” de pessoas monitoradas, em parceria com a Polícia Penal de Goiás. Sem mencionar novamente o vínculo entre desemprego e prisão, o prefeito disse que o objetivo é garantir o cumprimento das regras judiciais.
“Temos a obrigação de manter a cidade em ordem. A Polícia Penal tem a obrigação de controlar a execução da pena. Nós estamos nos juntando à Polícia Penal e verificando as pessoas que estão fora do que a pena determina. Ter tornozeleira não quer dizer que pode ficar passeando pela cidade dia e noite”, afirmou Mabel.
O prefeito criticou ainda o comportamento de alguns monitorados que frequentam bares e locais públicos durante a noite. “Não é porque a pessoa está de tornozeleira que deve achar que a cidade é um parque de diversões. Aqui não é lugar de confusão. Vamos manter a ordem”, declarou.
Repercussão nas redes e tentativa de esclarecimento
O vídeo de Mabel viralizou nas redes sociais, alcançando milhares de visualizações e comentários de juristas, políticos e cidadãos. No início da gravação, o prefeito reconheceu o caráter controverso da proposta, mas defendeu a medida como uma tentativa de reforçar a segurança pública.
“Não faz sentido que essas pessoas fiquem pelas ruas sem nenhuma ocupação. Queremos garantir que estejam dentro das regras”, disse o prefeito, que afirmou ter discutido o assunto com o governador Ronaldo Caiado (UB).
Ao final do vídeo, Mabel tentou adotar um tom conciliador, destacando que a gestão municipal e o governo estadual vão oferecer oportunidades de trabalho e capacitação para reeducandos. “Quem quiser trabalhar terá toda oportunidade. A Prefeitura e o Estado vão abrir caminhos e oferecer suporte para que essas pessoas possam se reintegrar de forma digna à sociedade.”
Contexto legal e repercussão institucional
Especialistas consultados pelo portal 5 Pontos News afirmam que a fala de Mabel ignora a estrutura legal da execução penal brasileira. De acordo com juristas, a remição de pena por trabalho ou estudo e o uso de tornozeleira eletrônica são medidas de natureza judicial, fiscalizadas pela Polícia Penal e supervisionadas pelo Poder Judiciário.
A posição da OAB-GO reforça o entendimento de que nenhuma autoridade municipal possui competência para determinar o recolhimento de monitorados, sob pena de violação à Constituição e às garantias fundamentais.
O episódio reacende o debate sobre segurança pública, ressocialização e políticas de reintegração social, em um momento em que Goiânia e outras capitais buscam equilibrar combate à criminalidade e respeito aos direitos humanos.












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